sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

O mais “chato” da Contabilidade é não ver o que está por trás dos números


Contabilidade Financeira. Nada poderia ser mais chato! Assim pensei ao ter contato com esta matéria, recentemente. Porém, com a brilhante condução do professor Sérgio Caldas (PUC RJ), comecei a entender que o “chato” é não perceber o que os números mostram, não de maneira explícita.

O balanço patrimonial é muitas vezes frio e aborrecedor, ainda que mostre uma fotografia de um determinado momento da situação da empresa. Por ser um relatório, tido como frio, dispõe os números de uma maneira padronizada e não muito simples de interpretar.

Uma grande discussão que tivemos em sala de aula, a partir dos ensinamentos do professor Sérgio, está relacionada com o impacto dos “intangíveis”. Cabe aqui uma primeira reflexão sobre o termo. Ao contrário do que muitos dizem, intangíveis não são apenas uma conta do balanço. Na maioria das vezes, os intangíveis manifestam-se nos números da empresa e não em uma “conta” particular de intangíveis. “Influências de intangíveis fluem naturalmente e se refletem nos números”. Como diz o professor Sérgio, “Todo intangível, em algum lugar no tempo, se tangibilizará”. É o caso do capital humano, por exemplo, que no momento de sua manifestação, acabará, muito provavelmente, gerando uma despesa ou uma receita, ou os dois.  Enquanto capital humano, ele pode ser apenas uma possibilidade e não um potencial claro de geração de bens e direitos (O que aconteceria se este capital humano deixasse a empresa antes de sua utilização?).

O ponto importante que quero chegar é na manifestação dos números, principalmente quando se apresentam de maneira recorrente de forma negativa (ex: prejuízo, ou baixos indicadores de desempenho) e da interpretação da causa raiz. A leitura de um balanço pode apresentar causas raízes muitas vezes de difícil identificação e atrelada a fatores intangíveis.

Pode parecer estranho, mas organizações também sofrem de doenças psico-somáticas. Justamente a componente humana desta organização pode estar interferindo na geração dos resultados financeiros inferiores ao resultado esperado. Do ponto de vista prático, uma organização onde apresenta um clima de desconfiança ou descrédito geral, vai motivar a força trabalhadora a empenhar-se por um resultado melhor? Ou o que pensar de um ambiente sem regras claras, reforçando o mecanismo de competição entre as pessoas?

Outra referência estranha: O tecido ético da organização pode estar dilacerado! Em uma situação dessas, o efeito negativo, do ponto de vista mais prático que possa haver, vai manifestar-se nos números que a empresa produz.

Portanto, ao olhar um balanço, tente enxergar o que está por trás dos números, como causa raiz, eventualmente olhando para o que pode ser classificado como intangível, ao invés de uma análise mecânica de valores e índices que dificultem a identificação do problema, enquanto há tempo.

Um grande abraço.

Moacyr Ferreira

3 comentários:

  1. Moacyr, interessantíssimo este tema. Parabéns pela escolha e pelo foco que você deu.

    Como você comentou, o 'chato' em relação à interpretação dos balanços e indicadores financeiros de uma organização é não extrair deles o que eles realmente podem dizer.

    Embora mostrem 'fotografias' (portanto aparentemente estáticas) no tempo em termos do estado de saúde finaceira da empresa, estes balanços e os indicadores que podem ser extraídos deles (vários dos quais dinâmicos), podem dar uma visão fantástica e muito completa sobre o desempenho negócio.

    Se interpretados por quem realmente conhece do assunto e está informado sobre a operação do negócio, a contabilidade financeira é muito interesante e viva, não chata e fria.

    É como um médico que faz a anamnese de um paciente. Se for competente e experiente (e, melhor ainda, se tiver o histórico do mesmo), poderá fazer um diagnóstico muito bom do estado de saúde de seu cliente com base nos dados colhidos. (Por sinal, o sistema sangüíneo foi utilizado como base para modelar a circulação e retenção de recursos na macro-economia)

    Ocorre que, em alguns casos, o paciente não quer ouvir o médico - seja por descrença, seja por negação do problema, seja outro motivo. O médico também pode errar no diagnóstico. Nestes casos a ação preventiva ou o tratamento recuperativo não serão realizados ou não surtirão o efeito desejado.

    Em uma empresa este tipo de situação ocorre frequentemente, especialmente quando a área financeira é vista de maneira dissociada do resto da organização, como um gerador de relatórios formais cujas conclusões não são absorvidas e devidamente consideradas nos processos decisórios.

    Mas você focou nos intangíveis, uma parte relativamente complexa do balanço patrimonial. Como considerar todos os intangíveis? Como tangibilizá-los? Como valorizá-los? Qual o peso de cada ativo intangível para a sobrevivência e sucesso do negócio?

    Uma patente (ou uma idéia) pode representar nada hoje, mas milhões amanhã. E a cabeça que gerou esta idéia? O capital humano que você comentou.

    Em outras palavras: os intangíveis são importantíssimos. E como cuidar deles para que sua aplicação gere valor e não destrua valor para a organização?

    Acredito que há intangíveis mais facilmente quantificáveis em termos financeiros como marcas e patentes.

    Ocorre que é difícil traduzir em números financeiros coisas como motivação, ética, confiança, entusiasmo, apoio, cooperação, criatividade, conhecimento, ...

    É possível quantificá-los de outras formas/ escalas, mas financeiramente não sei se/ como isto é feito.

    Talvez possamos extrair a seguinte conclusão desta discussão - em complemento à sua sugestão final: a eficiência (ou ineficiência) econômico-financeira de uma organização pode ser mostrada em números, mas os fatores que levam a ela podem necessitar de uma investigação conjunta de outras áreas como RH, Marketing, etc. e diferentes níveis organizacionais.

    Tal como uma equipe médica: o psiquiatra pode ser tão importante quanto o ortopedista.

    Um abraço.

    Leandro

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    1. Oi, Leandro.
      Obrigado pela participação.
      Você capturou bem: todos têm participação e influenciam os números nas empressa.
      Existe hoje, grandes discussões e linhas de pesquisa sobre a mensuração dos intangíveis. O detalhe é não subestimar este elemento, que não tem a ver só com patentes, invenções, mas como os elementos componentes da empresa estão reforçando ou enfraquecendo os resultados.
      Se uma empresa apresenta condições de mostrar-se saudável, mas os números não correspondem a isto, pode ser o momento de olhar para a organização com um olhar mais crítico, que não necessariametne passa por números, mas como o número está sendo formado, a partir da ação das pessoas, por exemplo.
      Abs
      Moacyr

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  2. Aprendi com este post! Ativos intangíveis vs. desempenho do negócio: uma correlação nem sempre clara, mas fundamental a ser gerenciada.
    Obrigado. Leandro

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