Se é verdade que o marketing tem como um dos pressupostos atender aos desejos e necessidades dos clientes, por que não, então, considerá-los no processo de criação deste produto? O tema parece interessante, mas traz uma série de pontos de interrogação. Por outro lado, abre espaço para que o consumidor comece a ser atendido com aquilo que, de fato, lhe interessa, enquanto consumidor. Este texto inspira-se no artigo de Daniel Ebb chamado “Balancing Research and Development (R&D) Expenses with Customer Innovation Demands e Prahalad (1996).
Falei em “posts” anteriores sobre a necessidade de um bom posicionamento do produto e da escolha da melhor estratégia alinhada com este posicionamento, para que se tenha, então, ações efetivas sobre o marketing mix. Tomemos aqui, novamente o tema de inovação, como um meio e não como um fim. Ou seja, o foco da inovação não deve estar somente no produto, pois este terá um ciclo de vida, cada vez mais curto. Se o foco em inovação for mais uma intenção estratégica, este suportará e colaborará diretamente com a estratégia escolhida e criará as condições para o surgimento de uma vantagem competitiva.
Ocorre que a inovação nem sempre é boa, principalmente se não for de encontro com as necessidades ou desejos dos usuários. Da teoria de Administração de Marketing, retiramos a lição de além do produto apresentar-se com seus benefícios núcleo, ou, em outras palavras, aquele que você contrata, ele terá mais sucesso se conseguir expandir suas características para um produto básico, quem sabe esperado, preferencialmente ampliado, trazendo características, de fato, novas, ou, até mesmo potenciais, indo além do que o consumidor esperaria do produto. Isto é o que acontece com produtos que tornaram-se verdadeiros “ícones” de sua indústria, como aconteceu por exemplo com as máquinas copiadoras da Xerox, que de produto, viraram sinônimo de referência ou até mesmo com produtos da Microsoft, que além de utilização em grande escala, tornaram-se padrão “de facto”.
Então, como atingir este estágio de desenvolvimento criando-se produtos inovadores, perfeitamente adequados com a necessidade do usuário e criando valores potenciais, muitas vezes identificados somente após o lançamento destes produtos no mercado, tendo o usuário como centro desta ação de descobrir novos usos a partir do produto básico?
A resposta pode estar justamente no consumidor como parte do processo de criação e desenvolvimento do produto. Note que aqui não me refiro apenas à concepção da ideia, mas do processo de desenvolvimento do produto, que algo ainda mais ousado.
Nos dias atuais onde a competição é feroz, a inovação solapa produtos com um grau de obsolescência que desafia a lei de Moore, com seu ciclo de 18 meses para produtos inovadores antes do ocaso, com a necessidade extrema de controle de custos e despesas, incluindo-se aqui os associados a pesquisa e desenvolvimento, acertar na escolha do produto para que ele se torne um sucesso no mercado faz muito sentido.
Como o próprio Prahalad (2012) menciona em seu artigo Strategy & Leadership, o consumidor está cada vez mais deixando de lado seu papel passivo e assumindo um papel mais ativo no processo de consumo, incluindo-se a criação e desenvolvimento de produtos.
Esta relação entre inovação e estratégias de marketing não é aleatória e está associada, segundo Rogers (1976) com a inovação em si, com a comunicação desta inovação, com o tempo que se leva para difundir esta inovação e com os aspectos sociais para a aceitação da inovação. Portanto, se a empresa não estiver preparada ou preparar-se para criar as condições necessárias para que a inovação apareça, para que ela seja transferida de conhecimento tácito para explícito, se não for coordenada com as ações do marketing mix, todo um esforço em nome de algo que potencialmente cria valor, irá, com o perdão da expressão, “para o ralo”.
O processo chamado de co-criação, segundo Prahalad (2012) traz algumas questões extremamente relevantes, para ilustrar que apesar de ser algo que pode trazer grandes benefícios, também traz grandes desafios:
- Como uma empresa pode manter um diálogo ativo com cada consumidor e, ainda assim, manter sua eficiência operacional?
- Como manter sobre controle o aspecto de qualidade nos padrões, mas, ao mesmo tempo, delegar parte deste processo a consumidores que não estão, em princípio, inseridos neste processo?
- Como praticar o aspecto de transparência sem expor a empresa à perda de conhecimento para o mercado e, eventualmente, para a concorrência?
- Como tratar o aspecto de heterogeneidade da base de consumidores, com demandas tão específicas como variadas?
- Onde começam e terminam os aspectos de responsabilidade legal para ambos os lados (empresa e consumidores)?
- Como tratar o aspecto de previsão de demanda em um ambiente tão imprevisível?
As respostas não são fáceis, mas a reflexão faz-se necessária. Neste sentido, talvez, as empresas da era digital tenham muito para ensinar, com exemplos pouco tradicionais como a Wikipedia e suas contribuições voluntárias ou para estarmos mais próximos do “bricks and mortar”, o sucesso do iPhone, e hoje de grande parte dos “smartphones”, onde cada produto é único no sentido de quem define o produto é seu usuário, através da escolha dos aplicativos, da “customização” do aparelho e do uso.
O que quero dizer com tudo isto é que trazer o consumidor próximo à empresa, à marca, é importante, mas talvez, para criar uma vantagem competitiva, que diferencie sua empresa da concorrência, talvez, seja necessário trazer o consumidor não para perto, mas para dentro da empresa e do processo de criação e desenvolvimento, criando identidade, colaboração, diversidade, inovação e, não menos importante, resultados financeiros superiores para a empresa.
Bom fim de semana.
Moacyr Ferreira
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